TRISTES NOTAS DE UM HOMEM DO CERRADO

>> segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009


De acordo com o articulista João Fortuna, em artigo intitulado “A evolução da agricultura e pecuária no Leste e Centro-Oeste brasileiro”, a soja tirou o boi do chapadão (Terciário).
Devido a isto o boi derrubou o cerradão (Bauru). A cana tira a soja, a soja tira o boi, o boi derruba a mata amazônica. São Paulo (dentro da mesma Bacia Geológica do Paraná) sempre na frente do resto, ditando o que se fazer com as terras. Se a novidade traz mais rendimento financeiro para o dono das terras é lógico que ela toma o lugar da anterior. São Paulo foi o maior produtor de café. Com a queda brusca do preço do produto muito rapidamente os cafezais (1930) se transformaram no maior celeiro de engorda de bois do Brasil (sendo que o boi é o último da lista, não pela rentabilidade, mas pela sua condição de se levar, nas regiões sem estrada, embrenhando em locais impossíveis.
A soja chegou a São Paulo e logo passou a ser o grande plantador de soja. Hoje São Paulo é o maior plantador de cana, o resto sumiu de suas terras. A soja provocou a saída do Gaúcho de suas querências e partiu para o trópico, atrás de terras baratas para seu plantio.
Os cerrados originais que abrangiam os Estados de Goiás e Mato Grosso, que eram os criadores de bois para abastecerem os invernistas de São Paulo e Paraná, foram invadidos pela soja e seus criadouros avançaram para o Norte de Mato-Grosso, Rondônia Tocantins e Pará.
A cana chegando ao Cerrado do Centro Oeste, fatalmente o boi vai pastar onde foi à maior floresta tropical da Terra. Em toda a Amazônia dominará a braquiá¬ria (planta da família das gramíneas), que só sairá quando tudo estiver tão árido que nem ela conseguirá sobreviver.
Conforme o artigo “A Questão dos Biocombustíveis no Brasil com ênfase no Metanol” do Dr. Giuseppe Bacoccoli, o Ministro da Agricultura diz que “será permitido, e até incentivado, o plantio na Amazônia, contanto que restrito às atuais áreas de pastagens, como em Roraima e em algumas áreas do Acre e do Pará (sic). Vamos permitir o cultivo em áreas historicamente desmatadas.
Não deixaremos que seja derrubada uma única árvore para produzir etanol e açúcar”.
Pergunto: para onde vão os duzentos milhões de gado dessas pastagens?
Veja que ele especifica (manhosamente) que não permitirá a derrubada de uma única árvore para plantar cana. (Para fazer pastagem está livre). Se ele tem capacidade de impedir a derrubada de uma árvore na Amazônia porque não impediu essa catástrofe?
Conforme nos fala Washington Novaes no Estado de São Paulo do dia 10/11/2007, “Nos quatro anos do atual mandato presidencial - incluída a última estimativa de 13,1 mil km2 para 2005/2006 - foram mais de 80 mil km2 (mais que em qualquer outro quatriênio)”. Ao longo de décadas, já são mais de 600 mil km2 desmatados. Não surpreende, assim, que quase 75% das emissões brasileiras de gases que contribuem para mudanças climáticas sejam por mudanças no uso do solo, queimadas e desmatamentos, principalmente na Amazônia. Porque não é isso que eles querem!
O fato de Bush achar que o programa de biocombustível é uma coisa boa para o Brasil é algo que um Presidente inteligente deveria desconfiar. Mas podem estar certos que o programa de biocombustível terá uma participação muito forte na destruição da Amazônia, embora isso, lá, seja irreversível, como o foi a destruição total da Mata Atlântica, dos Pinheirais e do Cerrado. Como será a do Pantanal, dos manguezais, das Caatingas e do Brasil. Jared Diamond, no seu livro “O Colapso”, alertou o povo australiano de que se continuassem fazendo tudo errado, em pouco tempo seria o fim do país deles. Vejam o que está acontecendo.
Num país no qual o próprio órgão controlador e fiscalizador da Política Nacional do Meio Ambiente, o IBAMA, criou programas como o Pró-Várzea destruindo as áreas de recargas dos lençóis freáticos; no Cerrado destruíram os Covais. Em outros biomas implantaram as grandes fazendas de criação de camarões e lagostas em cima dos manguezais.
O que esperar desse povo?
Já afirmava um articulista da ECA/USP: “O potássio é um elemento essencial para o crescimento saudável das plantas. Quando estas são queimadas, os sais de potássio em seus tecidos se convertem em carbonato de potássio, o qual, junto com outros elementos absorvidos pelo vegetal, formam as cinzas” – E isso desde os tempos do Egito até o Século XIX”. Com a carência de álcali, as regiões européias com florestas abundantes começaram a produzir o chamado “álcali vegetal” em escala industrial. As florestas da Escandinávia, as estepes russas e as matas dos Vosges na França foram destruídas para produzir cinzas.
As florestas do Canadá e da Nova Inglaterra na América também contribuíram com suas cinzas, pois nessa época começavam a ser derrubadas para abrir espaço para agricultura e pastagens.O processo de produção era simples.
Consistia em queimar as madeiras ou arbustos secos em buracos no chão, até que se formasse uma quantidade suficiente de cinzas. O carbonato de potássio era extraído das cinzas por mistura com água quente em tonéis com fundo falso furado coberto de palha. A solução coada contendo o álcali era evaporada em potes de ferro, formando uma massa marrom, que então era aquecida fortemente em fornos para eliminação dos resíduos de carvão.
O elemento assim obtido era chamado de potassa (vem do inglês pot ash, cinza de potes) ou perlassa (de pearl ash, cinza perolada, pelo seu aspecto e cor). O produto continha cerca de 70% de carbonato de potássio. Em média, conseguiam-se cerca de 10 kg de álcali bruto de cada 100 kg de cinzas.
Esse material podia ser usado na indústria de vidros, cerâmica e de sabão. A Espanha foi a maior produtora de “barrilha”. Em Jataí (GO), colocava-se a cinza (ou barrilha) no “barrilheiro” e adicionava-se água por cima, e depois se “aparava” a “decoada” para fazer o sabão. Com as chuvas vindas das queimadas da Mata Amazônica estamos recebendo decoação. Vejam que para fazer sabão destruíram muitas e extensas matas.
Agora, para fazer pinga e combustível para os ricos andarem em carrões e os pobres poderem imitá-los e andarem em carrinhos, lá se vai a Amazônia.O Homem mudou muito; naquele tempo ele derrubava as árvores com machado.
Hoje as derruba com moto-serra e correntão. E os políticos? Estes agem como há duzentos anos. Como esses bichos são imortais, se olhar com atenção ainda pode-se encontrar algum daquela época.
Por: Binômino da Costa Lima, pesquisador do bioma Cerrado e Doutor Honoris Causa da Universidade Católica de GoiásFonte: Revista ECO 21 nº134

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